Segue este por ter estado a ouvir conversa estapafúrdia e baralhada de quem vive de olhos fechados às artes, culturas e sentimentos inerentes, ficando assim sentadinho em cima de mitos que tiram, NESTE TEMPO, beleza aberta ao fruir da vida.
Não sei como a conversa começou mas estavam duas damas e um cavalheiro indignadíssimos com a descoberta que o filho de não sei quem, adolescente ainda no início, andava com intenções de ser bailarino e, ainda mais grave, se punha a inventar movimentos a pensar num colega da escola, mais velho, com quem nem sequer tinha trato. O cavalheiro alvitrou râguebi antes que a larva se tornasse “borboleta”, uma dama confirmou com um redondo “o mais possível”, a outra assou-se e eu reprimi a veneta de lhes enfeitar a cara, em gesto repentino, com a torrada de pão de Mafra.
Já nem sequer vou falar de “borboletas”, que quem usa tal nome para classificar bailarinos do sexo masculino, dancem dança ou não, e desculpem-me a provável altivez, não merece prosa.
Passo então à
Teoria geral mínima dos sussurros imaginados
Deixando os exemplos, que são tantos e intemporais, volto à experiência própria e alheia próxima em diversas áreas e de forma espremida e resumida .
Olham-se os gestos, o olhar, a forma de dizer palavras, o conteúdo do que dizem, a forma como se movem na rua, no restaurante…por aí fora e tornam-se a materialização de uma fonte de ideias.
Algumas, imaginam-se mais do que realmente são porque nunca se chega à fala, ou entendimento empático, com elas. Funcionam como modelos absolutamente abstractos. Muitas e muitos são-o sem nunca suspeitarem que o foram.
Outras são pontas de fios que se vão desenrolando. Existe o fascínio pela grandeza que se vai descobrindo. Preenchem o que faltava escrever, desenhar, ouvir, dançar.
Podem haver acordos tácitos onde nunca se pergunta, por maior que seja a confiança, o que vês nele ou nela. É coisa do foro intimo das obras. Pequenos tesouros encantados cheios de segredos que as fadas nos contam ao ouvido.
Não sei como a conversa começou mas estavam duas damas e um cavalheiro indignadíssimos com a descoberta que o filho de não sei quem, adolescente ainda no início, andava com intenções de ser bailarino e, ainda mais grave, se punha a inventar movimentos a pensar num colega da escola, mais velho, com quem nem sequer tinha trato. O cavalheiro alvitrou râguebi antes que a larva se tornasse “borboleta”, uma dama confirmou com um redondo “o mais possível”, a outra assou-se e eu reprimi a veneta de lhes enfeitar a cara, em gesto repentino, com a torrada de pão de Mafra.
Já nem sequer vou falar de “borboletas”, que quem usa tal nome para classificar bailarinos do sexo masculino, dancem dança ou não, e desculpem-me a provável altivez, não merece prosa.
Passo então à
Teoria geral mínima dos sussurros imaginados
Para os gregos só haviam nove musas, todas irmãs entre si, filhas dos amores entre Zeus e Mnemosine. Só sei o nome de uma, e a custo, que Terpsicore, a que ficou com o pelouro da dança, não é nome que me seja fácil.
Quando foi inventada, mal sabia ela que iria ter muita importância no principio do séc. XX. Mas isso pertence a outra história.
Não sei quais os métodos que usavam para proteger e inspirar os artistas.
Não sei quais os métodos que usavam para proteger e inspirar os artistas.
Só sei que as personagens paralelas inglesas, são fadas disfarçadas de mulheres (Elizabeth I estendeu tal disfarce também aos homens), que entram nos sonhos dos criadores enquanto estes estão a dormir e que, uma vez acordados, lhes dizem ou mostram o que por aquele mundo escondido viram.
Têm o dom de quebrar as faltas de imaginação chamadas bloqueios.
Só quem consegue “ouvir” a sua fada, perceber-lhe a linguagem, tem dotes para ser artista.
Para algumas tribos índias da América do Norte, é Musa, a rapariga ou o rapaz, que, pela extrema ligação à Mãe Terra, tem sensibilidade para revelar aos simples distraídos, os pequeninos, ínfimos pormenores em que se deve reparar, para tornar a vida mais feliz. Fazem-no através de gestos e expressões aparentados com dança.
Para algumas tribos índias da América do Norte, é Musa, a rapariga ou o rapaz, que, pela extrema ligação à Mãe Terra, tem sensibilidade para revelar aos simples distraídos, os pequeninos, ínfimos pormenores em que se deve reparar, para tornar a vida mais feliz. Fazem-no através de gestos e expressões aparentados com dança.
(Como curiosidade, sempre vos digo que são criaturas nascidas surdas-mudas.)
À sua maneira, esteticamente diferente da nossa, ligam a beleza e a arte à felicidade.
Por experiência própria e alheia, acredito mais nestes dois últimos grupos do que nas nove irmãs gregas. Sem ofensa.
Na correnteza da opinião comum ocidental, só existem Musas e nunca Musos. A arte, durante séculos e para algumas damas e cavalheiros, ainda hoje, é exclusiva do poder intelectual masculino. Assim como se liga Musa ao interesse sexual.
Átomos de Freud se volatilizaram para o passado e para o futuro na visão da coisa.
À sua maneira, esteticamente diferente da nossa, ligam a beleza e a arte à felicidade.
Por experiência própria e alheia, acredito mais nestes dois últimos grupos do que nas nove irmãs gregas. Sem ofensa.
Na correnteza da opinião comum ocidental, só existem Musas e nunca Musos. A arte, durante séculos e para algumas damas e cavalheiros, ainda hoje, é exclusiva do poder intelectual masculino. Assim como se liga Musa ao interesse sexual.
Átomos de Freud se volatilizaram para o passado e para o futuro na visão da coisa.
Na realidade, exceptuando casos em que o poder de alimento espiritual se aliou à paixão física, como em Andrea del Sarto ( que ao longo de toda a obra não utilizou outra musa que não fosse a sua mulher Lucrezia)
ou Rubens, Bach, Mahler,Liszt, mais influência tiveram, e têm, as moléculas de Platão.
Miguel Ângelo, Caravaggio, (para além da moda renascentista de qualquer ser, artista ou não, suspirar, em sociedade pública, pela sua musa ou muso), Oscar Wilde, todos eles homossexuais, tiveram em algumas mulheres grandes Musas. Como as têm tido grandes estilistas.
E, já agora, Henry James, Edith Warthon ou Kate Chopin, estes todos heterossexuais, contemplaram, como motor de obra, pessoas do mesmo sexo.
Talvez o caso mais flagrante seja o de Martha Graham: grande devoradora sexual do sexo oposto, confessou a sua paixão por algumas bailarinas inspiradoras. Coreografou a partir delas e para elas.
E, já agora, Henry James, Edith Warthon ou Kate Chopin, estes todos heterossexuais, contemplaram, como motor de obra, pessoas do mesmo sexo.
Talvez o caso mais flagrante seja o de Martha Graham: grande devoradora sexual do sexo oposto, confessou a sua paixão por algumas bailarinas inspiradoras. Coreografou a partir delas e para elas.
Maurice Bejart, foi coleccionando musa e musos, na minha opinião, sempre com bom gosto.
Foram assexuadas as inspirações e motes lançados por Lizzie Siddal (a tal rainha do desmaio conveniente e delambido, dos pré rafaelitas),
por Alma Mahler, por Marlene Dietrich, por Greta Garbo e, imagine-se,até por Sharon Stone, a do instincto temperado com sangue frio. São arquétipos de imagem e personalidade idealizada.
Deixando os exemplos, que são tantos e intemporais, volto à experiência própria e alheia próxima em diversas áreas e de forma espremida e resumida .
As Musas, ou Musos, nascem do nada. Tal como acontece nas outras paixões, não se procuram: encontram-se.
Não têm a carga afectiva do compromisso amoroso, embora muitas vezes, e por sorte, se juntem os dois destinos como já disse.
Aí, criar inspirado e para, é um acto de amor inteiro.
Mas em geral, e na realidade, são os criadores que lhes atribuem os dotes, que lhes inventam aquilo que precisam. São uma espécie de ferramentas de estimulo. Têm a riqueza da síntese.
Mas em geral, e na realidade, são os criadores que lhes atribuem os dotes, que lhes inventam aquilo que precisam. São uma espécie de ferramentas de estimulo. Têm a riqueza da síntese.
Olham-se os gestos, o olhar, a forma de dizer palavras, o conteúdo do que dizem, a forma como se movem na rua, no restaurante…por aí fora e tornam-se a materialização de uma fonte de ideias.
Algumas, imaginam-se mais do que realmente são porque nunca se chega à fala, ou entendimento empático, com elas. Funcionam como modelos absolutamente abstractos. Muitas e muitos são-o sem nunca suspeitarem que o foram.
Outras são pontas de fios que se vão desenrolando. Existe o fascínio pela grandeza que se vai descobrindo. Preenchem o que faltava escrever, desenhar, ouvir, dançar.
Nada impede que coexistam num harém sem regras nem hierarquias. Se algumas são descartáveis, outras acompanham as obras até ao fim. Ficam na memória como uma doce lembrança. Com a ternura de um agradecimento.
Muitas vezes é secreto o palco onde se movem. Mexer-lhes,analisar, pode tirar-lhes o encanto e a magia.
Mas enfim, não valia a pena perder palavras a explicar que, se calhar, também as borboletas escolhem um canto da paisagem onde vão roubar a cor.
E a torrada estava óptima.
12 comentários:
talvez a arte seja isso também: para além da realidade visível, acrescentar mais qualquer coisa que até talvez exista sem se ver.
e, como faltam dez para as três da noite, voltarei mais logo, na esperança de ser capaz de um comentário mais à altura do post.
Zizzie,
musa ou de outro nome qualquer, inspiradora de movimentos, formas, ideias ou de outra coisa qualquer, guarda em si a característica de possuir o que lhe é visível e de provável imaginação e tudo o mais que acorda nos outros, inspirando-os.
Dentro e fora da arte.
Não imagino o que possa ser uma vida, sem qualquer inspiração.
Ou sem torradas.
:)
Beijos e bom fim de semana
Triliti:
antes de mais, agradeço e admiro a elegãncia do galanteio contido no segundo parágrafo do comentário.
Fez-me lembrar um volteio de cavalheiresca esgrima com florete. E não estou a brincar nem a ser irónica.
É sempre bem aparecido seja qual fõr a hora.
E adoro saber das antecãmaras das obras de arte. Coscuvilhar o que lá está sem se ver. E é sempre tanta coisa.
Com frequência as vejo depois engrandecidas.
Lembro-me agora do muso de Thomas Mann, o rapaz de que não me lembro o nome, que deu origem à Morte em Veneza e a Mario and the Magician e de todos os conflitos interiores adjacentes.
E, no contexto deste post,é óbvio que não acho tratar-se de um caso de pedofilia, mas sim de contemplação da beleza e da juventude por parte de quem já perdeu o folego.
Encantamento inerente às musas e aos musos.
Espero que tenha dormido bem.
Arábica:
não consigo imaginar a vida sem a capacidade de sentir com a fineza de toda a sensualidade (sentido lato e não exclusivamente ligado à sexualidade como é uso),que é coisa muito ligada a todas as artes,sobretudo à dança que mexe com todos os sentidos.
A vida sem isso seria absolutamente maquinal, feita de aço melhor ou pior temperado.
E... sensualidade tenho eu a comer aquelas torradas preparadas por uma senhora que já deve ter nascido com ar de avó:fina, bem tostada e com pouca manteiga. Crocante sem ser agressiva nem na boca nem nos ouvidos:)
Já tentei roubar o toque à musa das torradas, mas as minhas nunca ficam iguais:)
Bom fim de semana.
Tia Lizzie, a Lizzie Siddal tem a ver com a tua família?
gostei de ler a tua história !
Chuac!- do Tolilinho para ti!
Tolilo:
A Lizzie Siddal não é da família da tia Só Lizzie porque aquela é da família dos que têm chiliques quando querem e fazem birras e a Tia Só Lizzie não tem esses hábitos e durante a vida só desmaiou três ou quatro vezes e com justa causa.
Só para tu veres, mas não é para imitares, a Tia Só Lizzie desmaiou uma vez que a puseram no colégio de castigo, em pé, contra a parede.
Estava calor e lá vai disto, ficou a Tia Só Lizzie muito branquinha.
Apanhou toda a gente semelhante susto que foi remédio santo: esse castigo a Tia nunca mais teve.
Depois a Tia Só Lizzie ameaçou desmaiar outra vez e a professora mandou fazer muitas cópias. Ai tantas e tão inúteis...! Como estava sentada na carteira não tinha razão para desmaiar e não desmaiou.
Mas a Tia fez uma jura: durante toda a vida havia de dar erros ortográficos.
Até hoje, como a Tia é honrada, nunca quebrou a jura.
Beijinho na bochecha e pode molhar um bocadinho de torrada no leitinho.
Lizzie,
Cá venho dizer-te que a tua musa ou muso ou ambos continua a inspirar-te para estes posts e respectivo acompanhamento.
Uma notinha: olha que as "Musas" dos Gregos... enfim, sabes como eram os gregos :)
Outra, esta pessoal: Tenho-me inspirado, como creio que se nota no que publico no blog, mais em musa(s) do quem musos e, por vezes, nem numa(s) nem noutros. Muitas vezes não vejo as musas (musos) como pessoas. Podem ser coisas, factos, momentos... Podia até inspirar-me neste post, se estivesse de maré (coisa que, de todo, não estou...).
Boa semana e um abraço.
Lizzie,
Cá venho dizer-te que a tua musa ou muso ou ambos continua a inspirar-te para estes posts e respectivo acompanhamento.
Uma notinha: olha que as "Musas" dos Gregos... enfim, sabes como eram os gregos :)
Outra, esta pessoal: Tenho-me inspirado, como creio que se nota no que publico no blog, mais em musa(s) do quem musos e, por vezes, nem numa(s) nem noutros. Muitas vezes não vejo as musas (musos) como pessoas. Podem ser coisas, factos, momentos... Podia até inspirar-me neste post, se estivesse de maré (coisa que, de todo, não estou...).
Boa semana e um abraço.
Alien:
obrigada por teres passado por aqui apesar da falta de maré.
Como eu percebo...!
Pois, os gregos, nisto como em muitos outros campos:)
Pois que tenho musas e musos pessoas(embora, já que falas nisso, não tenha contabilidade feita)e coisas.
Para te dar um exemplo de duas:
uma casa que me inspira há vinte e tal anos. Só a vi uma vez, nunca entrei nela, embora o fascínio nos tenha feito ir até à entrada. Digo "nos", porque é musa partilhada e trabalhada. Quem viu não esqueceu. E tão, tão simples.
Agora ando outra vez a trabalhar nela.
Outra foi um retrato, do séc XVI, completamente fora do estilo da época, que vi há muitos anos, não me lembro onde, e voltei a ver, boquiaberta, numa exposição que houve no Museu de Arte Antiga, em Lisboa.
O mais engraçado, ou não, é que não me lembro do nome do autor. Devo tê-lo esquecido para autonomizar a obra:)
Estas duas "coisas" já renderam muito em circunstâncias diversas. E a tal casa é quase um santuário, ou um museu (ambos versáteis),de diversos tempos e estados de espírito.
Um grande abraço forte para vocês.
de musas, por vezes, bem precisaria eu. mas que não me aparecessem de noite e me acordassem, que gosto de dormir sossegado e para me contrariar já bastam as insónias.
e só mais uma pequena observação antes de ir de abalada para Vale de Lençóis o que não quis fazer sem passar aqui por este santuário: não deverá ser cometido, nunca, o sacrilégio de malbaratar uma saborosa torrada de pão de Mafra nas ventas de tais energúmenos.
e mais uma vez me despeço que as frescas e verdejantes planícies do meu leito por mim chamam maternalmente.
Triliti:
também gosto de dormir sem incómodos, mas à hora a que recolheu ao Vale Maternal dos lençóis, esta noite, acordaram-me elas e eles e só passadas duas horas me deram repouso.
Ando em trabalhos e, as ditas, quando se lembram, acordam-me. Não sei se lhes agradeça, se lhes ralhe.
E mais digo que nunca, mas absolutamente nunca, se devem desperdiçar torradas ou outras iguarias com semelhantes cabeças de óprobio.
Os meus desejos de boa noite.
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