quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Para este, não me apetece nenhum título em especial

Já estou a aparelhar os cavalos! Anseio pelo galope!

Se a vida não me afligir com mais setas de desgosto, vou-me restaurar!


Peço desculpa a quem gosta de geografias tórridas mas vou com intenção de chamar o Outono a estas terras.

Pode ser a única maneira do livro do Inferno não passar do prefácio, que vai longo,


já que não sou anjo bastante para assassinar todos os danados surdos aos gritos das florestas e dos seres que nelas têm morada e assento.



Apetece-me dormir até ressuscitar. Num quarto branco simples onde possa inventar as paisagens dos sonhos em que não tenha mando nem comando. É tempo de ter despertares que não me amputem as histórias.
Talvez me abandone, pasmada no alpendre, a olhar para as pontas das ondas, em maré cheia, a esbarrar no penhasco.

Aquele mar musculado e sem travões, parece-me sempre um atleta teimoso a sonhar alturas. Um oceano com delírios de pássaro foi coisa nunca vista, convenhamos.
Mas talvez não me apeteça ser tão racional que desdenhe a pretensão de lhe adivinhar os sonhos.
Ficar muda e queda é sempre uma forma de atrasar o tempo.

Talvez me dedique com calma agradecida, a olhar para as mãos faladoras dos meus. A pressa dos dias só deixa ouvir as palavras saídas das bocas.

E, não, não estou nada de acordo com o Leonardo da Vinci quando odiava as mãos e as dizia fontes de todos os pecados, residências perversas do Diabo.

As mãos dos que gosto, parecem-me sempre refúgios de confiança e ternura mesmo quando recolhem pedrinhas ou paus no areal ou quando me afagam distraidamente o cabelo ou quando ajeitam as vestimentas na frescura da noite ou quando seguram as chávenas, envolvendo-as com os dedos ou quando desenham, escrevem.



Não lerei livros cheios de pensamentos suados como este que acabei de ler,


apesar das surpresas que a História guarda. Antes tomar chá com o Judeu Cristo que com Maomé. Credo, sabia lá eu que…

De qualquer forma, apetece-me um paraíso mais terreno, decorado de coisas simples, comuns no pensar e na tarefa.


Como os tempos não andam mansos, vou plantar uma azinheira que é árvore completa onde se guardam as memórias e moram os feiticeiros e as fadas que distribuem bom futuro.

E uma laranjeira. E um pessegueiro. E uma oliveira. E uma tília.
Fora de época, é certo, mas a nascença deu-me green finger que contraria as estações.

Talvez, pela noite dentro e que me é tão cara, conte em conversa descosida as lendas nortenhas das árvores.

A propósito, apetece-me levar uns discos da Maria Tereza de Noronha e da Hermínia Silva para o inglês com quem sempre me cruzo nos longos passeios pela praia extensa e quase livre de gente.


Anda há tanto tempo a sacudir a tristeza fechada que acabou por me confessar que encontrou um ombro na dolência lusa do Fado.

E talvez viaje sem rumo e de olhos fechados, pelas vozes dos motetes de Josquin Dês Prés porque é bom fugir para dentro da música como quem se recolhe num castelo de arquitectura perfeita.

Mas também irei para a terra onde toda a orgia de emoções se dança e se canta geneticamente no corpo



e em que o bulício se torna involuntariamente criativo. E gerador.


Cavalgarei pelo ritmo do apelo dos contrastes.

De alguma maneira arranjarei tempo para vos contar.
Já fui avisada que me vão sufocar as horas.
Depois, demorará tempo, a mim e a quem tem intervalos, a voltar à sala onde me maquilharei ou me vestirão de pessoa útil e utilitária, produtiva e a gerar produção.


Guardaremos, vós e eu, segredo: todas as maquilhagens são títeres de uma alma que mantemos mais funda.


Então, até um dia destes!