Segue pois a história
Da mulher que devorava os instantes.
Isadora Duncan (1877-1927) não nasceu com destino plano.
Pelo que ela disse, pelo que os outros dela disseram, pelo que ela imaginou e os outros inventaram, entre realidades e ficções, tem-se a sensação de entrar num glaciar de fogo. Ou num incêndio de gelo.
Ficou tão conhecida pela revolução na dança como pelas sucessivas obsessões com ramificações em escândalos.
Nasceu de um sonhador arbitrário e megalómano (só ele daria post) e de uma mãe professora de piano em recurso de sustento dos filhos. Ambos eram votados às artes.
Divorciaram-se.
Na ausência do pai diletante, Isadora cedo se habitou à música, com Bach como protagonista, à fome, a pedir dinheiro emprestado ou dado, a desenvencilhar-se.
Toda a vida alternou a fortuna com a miséria. Era capaz de, num dia, gastar o dinheiro suficiente para um ano.
Sempre lhe valeu o eterno apaixonado, mesmo quando utilizava o dinheiro dele para pagar a rapazes que seduzia na rua, Paris Singer, filho do inventor das máquinas de costura e pai do segundo dos seus três filhos.
Nasceu de um sonhador arbitrário e megalómano (só ele daria post) e de uma mãe professora de piano em recurso de sustento dos filhos. Ambos eram votados às artes.
Divorciaram-se.
Na ausência do pai diletante, Isadora cedo se habitou à música, com Bach como protagonista, à fome, a pedir dinheiro emprestado ou dado, a desenvencilhar-se.
Toda a vida alternou a fortuna com a miséria. Era capaz de, num dia, gastar o dinheiro suficiente para um ano.
Sempre lhe valeu o eterno apaixonado, mesmo quando utilizava o dinheiro dele para pagar a rapazes que seduzia na rua, Paris Singer, filho do inventor das máquinas de costura e pai do segundo dos seus três filhos.
Um dos desenvencilhos adolescentes, foi dançar na penumbra dos fundos de palco para acentuar o dramatismo das peças melodramáticas, espécies de Shakespeare para serões de trabalhadores, tão ao gosto do público da época.
Em boa verdade, mais que dança, era exibição rebolada das formas femininas ao critério da imaginação dos espectadores. Consta que a imaginação progride em relação proporcional ao puritanismo.
Durante toda a vida manteve quatro ódios constantes:
-aos bancos da escola tradicional por achar que neles se ensina o que nunca interessa;
- ao Ballet Clássico por ser uma forma artificial e feita rígida prisão de celebrar o corpo e a dança;
-ao Jazz por ser manifestação de uma cultura vinda de povos bárbaros. Para Isadora, toda a civilização assentava na Antiga Grécia;
- à passividade feminina em relação ao destino e aos amores.
Abandonou a escola mas, desde pequena, sempre foi uma leitora compulsiva, sobretudo de filósofos e visitante de dias inteiros, repetidos e repetidos de museus.
Sarah Bernhart descreveu-a até como uma miúda irritante e afectada na demonstração da sabedoria.
Fundou, sem sucesso, três escolas.
Em boa verdade, mais que dança, era exibição rebolada das formas femininas ao critério da imaginação dos espectadores. Consta que a imaginação progride em relação proporcional ao puritanismo.
Durante toda a vida manteve quatro ódios constantes:
-aos bancos da escola tradicional por achar que neles se ensina o que nunca interessa;
- ao Ballet Clássico por ser uma forma artificial e feita rígida prisão de celebrar o corpo e a dança;
-ao Jazz por ser manifestação de uma cultura vinda de povos bárbaros. Para Isadora, toda a civilização assentava na Antiga Grécia;
- à passividade feminina em relação ao destino e aos amores.
Abandonou a escola mas, desde pequena, sempre foi uma leitora compulsiva, sobretudo de filósofos e visitante de dias inteiros, repetidos e repetidos de museus.
Sarah Bernhart descreveu-a até como uma miúda irritante e afectada na demonstração da sabedoria.
Fundou, sem sucesso, três escolas.
Foi por esta via que se apaixonou (nunca tinha interesses ou curiosidades mas sim paixões arrebatadoras) pela Primavera de Botticelli. As Três Graças, neste quadro,
inspiraram-lhe movimentos e figurinos.
A turbulência em que vivia, justificava-a com o dito de Oscar Wilde: vale mais o prazer que dura um minuto que a tristeza que dura toda a vida.
Quanto ao Ballet, Isadora defendia os movimentos do corpo de uma forma natural, alegre, ao sabor da improvisação.
Quanto ao Ballet, Isadora defendia os movimentos do corpo de uma forma natural, alegre, ao sabor da improvisação.
Embora admirasse a ultra conservadora e esmeradamende tecnicista disciplinada Anna Pavlova,
não suportava a claustrofobia dos tutus, das sapatilhas, as regras.
Mas, embora as suas coreografias pareçam infantis e desordenadas, dançando-as, percebe-se que há ali uma técnica muito mais difícil do que parece.
Queria o corpo livre como estado honesto dos apetites da alma.
Queria dançar Chopin ou Schubert ou Bach ou Wagner.
Dançava descalça e com as túnicas largas.
Sem artifícios ou maquilhagens.
Sem artifícios ou maquilhagens.
Estas, só as usou para disfarçar as cargas de pancada. Mas já lá vamos.
Tornou-se tão desbragada na exibição livre do corpo, e do gozo dele, que a intelectual Cósima Wagner, viúva do dito, acabou por lhe fechar as portas das suas tolerantes tertúlias. Demasiado Dionísio à solta.
(boto aqui este livro que acho fascinante em vários aspectos)
Foi várias vezes vista a dançar nua na via publica.
A tal ebulição do instante.
Para além de depender do olhar dos outros sobre a sua pele. Toda a vida necessitou, mais que de pão para a boca, de ser venerada e seduzida.
Tinha que se sentir fonte de desejo dos homens e das mulheres.
Vivia tanto a época Clássica, que, na Grécia, comprou, melhor, compraram-lhe, um vastíssimo terreno com o fito de restaurar o culto dos deuses gregos.
Para a primeira pedra do templo, convidou um sacerdote vestido de preto que sacrificou um galo também negro.
Tinha que se sentir fonte de desejo dos homens e das mulheres.
Vivia tanto a época Clássica, que, na Grécia, comprou, melhor, compraram-lhe, um vastíssimo terreno com o fito de restaurar o culto dos deuses gregos.
Esqueceu-se de reparar que tal terra era seca como o deserto. E que ninguém pode viver sem água.
Nunca percebeu porque os gregos já não veneravam os deuses antigos nem aderiam ao entusiasmo do seu culto.
Como não percebeu, quando se converteu à Revolução Russa, porque é que os camponeses de aldeias remotas, não admiravam as suas danças, nem Chopin, nem Wagner nem os outros.
Sempre odiou o conceito de dona de casa, mãe de família. A dependência dos homens.
No entanto, entrava em grandes depressões quando era abandonada pelos seus inúmeros amantes.
As suas tragédias têm sido objecto de inúmeras coreografias,algumas, imagine-se, de Ballet Clássico ou Neo Clássico.
e peças de teatro.
Aliás, sempre foi motivo de inspiração, mesmo para artistas seus contemporãneos.
Ou então, recorria aos amores femininos.
Embora, em escritos oficiais, estranhasse a homossexualidade, escrevia-lhes cartas de amor inflamado. E não propriamente platónicas.
Foi amante de famosas como a bailarina, também muito inovadora e de vida convulsa, Loie Fuller,
da actriz atormentada Eleanora Duse
Foi amante de famosas como a bailarina, também muito inovadora e de vida convulsa, Loie Fuller,
e da abrangente destruidora de corações, nomeadamente o de Greta Garbo, a "poeta" Mercedes Acosta.
À excepção de Singer, todos os homens a abandonaram ou mentiram.
Algumas mulheres foram-lhe refúgio até à morte.
A todos dava nomes de divindades gregas ou de personagens de óperas de Wagner.
A todos dava nomes de divindades gregas ou de personagens de óperas de Wagner.
A todos prendia numa posse esfomeada.
Tinha ciúmes doentios que chegavam a levá-la a estados de choque ou desorientação.
Talvez os mais marcantes tenham sido o talentoso cenógrafo Gordon Craig, pai da primeira filha.
Rodin ,
Tinha ciúmes doentios que chegavam a levá-la a estados de choque ou desorientação.
Talvez os mais marcantes tenham sido o talentoso cenógrafo Gordon Craig, pai da primeira filha.
e o rapaz italiano seduzido na rua e a quem pagou uma fortuna para que a engravidasse, de forma a que o novo rebento fosse a reincarnação dos outros dois filhos mortos por afogamento.
Aliás, acreditava que muita coisa diária, ligada à natureza, eram os filhos.
Entrou numa espiral de consultas a videntes e outras mensageiras do além.
Mas a mais avassaladora e obsessiva foi a paixão pelo poeta Sergei Esenin, quase vinte anos mais novo.
Por ele Isadora casou, aos quarenta e tal anos, perdeu a nacionalidade americana. Foi expulsa de vários países, teatros, restaurantes, hotéis.
Conheceu-o quando se embrenhou na Revolução Russa.
Conheceu-o quando se embrenhou na Revolução Russa.
Apesar de revolucionário, Sergei queria vingar nos círculos intelectuais aristocráticos e de alta burguesia da Europa e dos EUA.
Tinha uma ambição sem limites, um cérebro marinado em álcool.
Queria conhecer gente importante e para isso dava festas escandalosamente caras. Dormiam nos hotéis mais luxuosos. Isadora mantinha-lhe os caprichos com receitas dos espectáculos e com o dinheiro de Singer, a quem chantageava com ameaças de suicídio.
Apesar dos conselhos dos amigos, Isadora continuou a suportar os insultos públicos de “vaca gorda” e a levar sovas físicas e psicológicas.
Afastava-se num dia, abria os braços no dia a seguir.
Começou a dar espectáculos deprimentes, completamente alcoolizada ou com ópio paliativo. E cheia de hematomas. Isadora defendia sempre o seu Apolo. Até perder a dignidade privada e o respeito público.
Apesar dos avisos, antes das danças já patéticas e sem talento e arte, cantava a Internacional e fazia comícios.
Em Boston, por exemplo, além de interromper a dança com uma espécie de comício, durante um jantar de homenagem a Isadora, Sergei subiu para cima da mesa e urinou para os pratos dos convivas.
Chamou porcos imundos aos judeus e “montes de merda” às mulheres que na altura, ali, já eram professoras universitárias, administradoras e comandavam os seus destinos.
No mais caro hotel da cidade, destruiu obras de arte, deixou Isadora desmaiada depois de murros na cabeça.
No mais caro hotel da cidade, destruiu obras de arte, deixou Isadora desmaiada depois de murros na cabeça.
Isadora, só desistiu de viver com Sergei quando este a acusou publicamente da morte dos três filhos e lhe apresentou formalmente as amantes grávidas.
Isadora, abandonou a União Soviética quando todos os seus projectos foram sujeitos a condições ideológicas.
A dança, figurinos, música, tinham que obedecer a padrões obrigatórios, contrários ao que sempre tinha defendido.
E quando um outro querubim, por quem se apaixonou, desapareceu.
A dança, figurinos, música, tinham que obedecer a padrões obrigatórios, contrários ao que sempre tinha defendido.
E quando um outro querubim, por quem se apaixonou, desapareceu.
Voltou para a Europa. Para Nice.
A par de tertúlias com os mais conotados artistas e intelectuais, manteve-se activa nas buscas nocturnas, pelas ruas, de rapazes belos.
A ultima paixão foi um imberbe mecânico de automóveis. Convenceu, por isso, Singer a comprar um Bugatti.
Foi com o rapaz experimentar o carro. Por causa da échape, partiu a cervical e morreu sem aviso nem espera.
E se viveu e morreu de instantes, mudou a Dança Ocidental em direcção à eternidade.
A ultima paixão foi um imberbe mecânico de automóveis. Convenceu, por isso, Singer a comprar um Bugatti.
Foi com o rapaz experimentar o carro. Por causa da échape, partiu a cervical e morreu sem aviso nem espera.
E se viveu e morreu de instantes, mudou a Dança Ocidental em direcção à eternidade.