quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Mantillas, mantón de Mañila,chale-xaile


Todas fazem parte do vestuário femenino espanhol e suponho que o chale corresponde ao xaile português já que ambas são palavras de origem asiática.

As mantillas botam-se por cima da cabeça. São normalmente rendadas e têm origem árabe. Encobrem os cabelos, fonte de pecado. Cabelo solto só na intimidade da camãra. Ainda hoje são obrigatórias em situações solenes sagradas ou profanas. Rivalizam as damas na beleza de tal traje, sobretudo na Semana Santa em Sevilha. Em tempos, salvo erro nos idos de XIX, as mulheres de Madrid, saíram à rua em poderosa manifestação de mantilla emproada como protesto contra a introdução de chapéus e outras modernices. Esta que aqui vos escreve já teve que usar uma e ficou com maior cara de parva que aquelas senhoras ali em cima.

Aqui temos o mantón de Mañila. Reza a lenda que foi inventado pelas operárias das fábricas de tabaco em Sevilha. As folhas de tabaco vinham das Filipinas embrulhadas em panos chineses velhos, muito ornamentados e de forma quadrangular. As coitadas cortavam-nos e descobriram que davam jeito : colocados em triângulo sobre os ombros deixavam os braços livres e protegiam do frio. Práticos mesmo para saída rápida à rua.

Com o tempo desenvolveu-se basta arte artesanal em bordados e franjas, primeiro com motivos asiáticos depois com florais eupopeus. E os do dia a dia e os de ir a festas e missas. Diz a lenda que consoante o estado de espírito e apetite amoroso assim se usam cores, flores e ramagens: rosa-segredo-paixão de Cristo, margaridas-impaciência, lírio-pureza intacta, girassol-fidelidade e assim de repente não me lembro de mais nenhuma.
Ainda hoje são pendurados como enfeites nas varandas à passagem das procissões.

Falta o simplesmente mantón, mais conhecido por chale e xaile.
Parece que também veio da China. Em centenas a.c. já as chinesas da alta sociedade os usavam. Portugueses e espanhóis nas suas andanças trouxeram o conceito para a Europa. É curioso que no séc XIX era quase obrigatório nas ruas e salões de Boston e Califórnia.
Foi rápidamente de uso comum pelas mulheres de todas as classes sociais e cada região adoptou os tecidos que melhor convinham ao fim e temperatura.
São mais ou menos longos e pouco ou nada espaventosos em ornamento.

No flamenco são essenciais e a forma de os colocar e de os movimentar é uma linguagem complicadíssima e difícil. Em linguagem simbólica rivalizam com os leques. Podem até dar boa ou má reputação a quem os manobra. Conta-se até a história de uma cigana que de virgem demonstrou ser meretriz experiente e o pai, vingando a honra da família, ali mesmo lhe penetrou punhal no duvidoso ventre. Nunca mais dançou, La Niña de los Claveles.

Estivéssemos ainda naqueles tempos e esta moçoila estaria já a bailar para os intermédios do Purgatório. Está a oferecer, com algum recato, as suas graças ao seu amado pois que destapou um ombro mas o outro está resguardado assim como os olhos no chão. Mas na continuação da dança escancarou as portas do Inferno. Vi eu, que não nasci ontem.
Dizem os entendidos que tudo isto não passam de factos imaginários e não científicamente comprovados. Onde nascerem, a evolução.

Cá para mim é-me indiferente porque gosto dos xailes, sobretudo aqueles quentinhos de boa flanela, presos com alfinete. São acolhedores da forma dos ombros, fica-se com os braços soltos para encher caderninhos ou ler e se se juntarem os joelhos ao queixo não se importam de abraçar o feto já tão grande. Em noites frias e límpidas gosto de ir fumar um cigarro para o meu jardim e puxá-lo para cima da cabeça enquanto imagino o Fado das estrelas. E que bem que elas cantam na sua eterna voz de luz.

8 comentários:

Lizzie disse...

Desde já um pedido de desculpas: só agora é que vi que este ainda tem mais erros e gralhas do que é meu uso e deficiência. Mas foi escrevinhar à pressa, publicar rápidamente e só agora voltar a ler. Até eu estou escandalizada, que também tenho direito!
Vou puxar o xaile até aos olhos.
Com licença...diz a tradição que assim se deve proceder.

St. J. disse...

Lizzie,

Confesso que o mais horripilante da escrita é rever a dita. Para quem escreve duas vezes por semana, a coisa ainda vai. Para quem escreve todos os dias e noites, torna-se um pesadelo.
Rever 100 mil caracteres de escrita por semana é um enjoo. 400 mil caracteres por mês, é um vómito. 1,2 milhões de caracteres por trimestre é assim uma daquelas coisas diarreicas. 4,8 milhões de caracteres por ano é mesmo isso: «tirem-me deste Infernoooo».

Posta a coisa, Lizzie, acredite, uma gralha é só uma benção que não queimou mais umas tantas pestanas...

Last but not least, os Xailes estão de cair p'á banda...

Bijufas
;)

Lizzie disse...

Pues Neno Xantinho e eu devo confessar que quase nunca leio o que escrevo. Poupo-me o trabalho de ficar a pensar será que é assim?
Chego lá, ou não, pela forma visual, quase por instinto.

Se eu tivesse essa carga numérica às costas morria. Seria pior a emenda que o soneto. Em casos sérios vou ver ao dicionário, mas é tão inútil para o futuro que perco a paciência.

Quanto aos adereços da vestimenta é engraçado conhecer-lhes, ainda que de forma pouco aprofundada, a história. No flamenco é fascinante o código de "conversa" do mantón, assim como as palavras não ditas pelos chapéus dos negros do Alabama e arredores. É a importãncia dos pormenores ou pormaiores. Afinal quantas linguagens tem o mundo?

Besos e bom fim de semana sem revisões a bem da saúde das pestanas.

Emma Larbos disse...

À velocidade a que "postas", cara Lizzie, não consigo acompanhar-te. Ainda agora vim de ler o lindíssimo post dos ciprestes e dos bancos e dos fios em que nos enredamos e já sinto o roçagar dos xailes e das mantilhas.
Para mim, desde a infância, sempre significaram casamento e morte, princípio e fim, entrega e despedida. No baú da minha avó materna havia dois chailes pretos. Um de seda bordada que - assim me contava - tinha usado no dia do casamento e deixaria à minha mãe (a única filha), outro de lã, com as franjas por único enfeite, que havia de a amortalhar quando chegasse a hora. Ainda hoje, quando vejo um xaile preto, pergunto-me: é de festa ou de despedida? Canta ou chora? Dança ou parte?
Muito têm que contar os xailes!

nnannarella disse...

Ah meu Arcanjo chaleado...:)Que ricas histórias nos trazes dessa peça a que sempre dei grande atenção a agrado, e não só por fazer parte do Fado. Comovente foi também o andamento da Emma...

Quanto às gralhas, subscrevo o Seintji e digamos que, assim, em convívios suculentos de afectos, pouco importam para quem sabe ler. E ... não!, não puxes o xaile, que ele não quer esconder esses teus altos olhos cor d'azevinho do Gerês.

nnannarella disse...

E repescando uma conversa lá de baixo, espero que a barregã da dor esteja morta e enterrada, não em vaso delicado, mas em sete pés de profundidade, sob terra bem pesada; e que dela terra tenham nascido mais caderninhos com ciprestes azuis ou glicínias cor-de-laranja; e que os dias te tenham corrido sem muito terrorismo das cadelinhas, a quem envio os meus beijinhos rútilos e saudosos. A minha Camila está a precisar de uma Greta ou de uma Garbo, porque a mais nova lhe pisou um pé com aquelas portentosas patas de maratonista. Enfim.Quem tem miúdas tem cenas sesudas... Termino a noite cálida com uma caipiroska bondosa. Dias bondosos também para ti, adro soalheiro e... matrioskas e matrioskas!

Lizzie disse...

Cara Emma, tem razãoa Nnanna na sua comoção.
Também eu tinha dos xailes,em Portugal, ideia oscilante mas quase sempre triste. Quando ia ao Alentejo via aquelas mulheres de olhar negro sacrificado quase sempre a olhar direito para a morte.
Dos espanhóis lembro-me de ter, além desta, uma versão mais alegre.
Foi com uma colega mexicana que aprendi o lado confortável e utilitário do pano. Ela andava sempre com um, espécie de talismã, como o são por aquelas terras cheias de deuses e demónios.

Boa semana

Lizzie disse...

Ai meu Anjo, que as miúdas dão-me cabo da cabeça. Mas não me consigo zangar com elas, tal é o amor daqueles olhinhos novos a olharem para mim.

A dor está melhor ainda que não totalmente enterrada e da terra letárgica já morreram mais páginas brancas de caderninho para florirem em cor e desenho, que ando em fase de nelas plantar retratos do que dos outros sinto no centro da alma. Começam a dar-me sementes para as mãos e viro jardineira.

Folgo que estejas de voz aberta outra vez. Nem te consigo imaginar de voz fechada e recolhida.

As melhoras da Camila.
e fica-te com traços e traços loucos deles