segunda-feira, 8 de outubro de 2007





Acabo de chegar do reino dos pés nus. Por lá andei com a memória dos cansaços agora feita visão, espera, traço e palavra.

Passo no estúdio 1,coisa grande e farta de gente onde o flamenco se junta com o rigor do grande classicismo, pois do clássico, pensamos nós que já somos gente antiga, parte toda a fonte do que depois se há-de dançar.

E , à entrada do 2, fico de pés expostos como se terreno de mesquita se tratasse.Ali se rezam corpos doces e bruscos, espaço onde os nossos se amassaram sem que mais fermento houvese que a intenção de nobre Arte.

Agora é tempo de ensaio para uma saudade feita amor distante. Ensaia-se a solidão em corpo já gasto. A recordação da felicidade gera urgência. Ensaiam-se palavras, ajustam-se tempos, movimentos enclausurados na distãncia.




Quem do ofício sabe, lê, corrige, em qualquer sítio e posição, pautas de solfejos em que as notas são movimentos e gestos, espaços e tempos. Podem ser maestros ou aqueles que se debruçam sobre escritas medievas com segredos ocultos.



e ainda bem que nunca me deu para aí. Com a minha dislexia havia de provocar torcicolos na assistência: ficavam os bailarinos a dançar no tecto, com as luzes no chão do palco, pés ao contrário, sei lá se não lhes saíria um braço da testa nesta matemática invertida.

Mas quem sabe, vai criando poesia que nunca nenhuma nasceu criada e aqui todos são um na obra que se quer final mas sem fim, que nunca nada se repete. Nenhuma alma nem corpo tem o coração de ciência exacta.

E lá deixo as imperfeições do meu caderninho, deixo-o todo à mercê dos sorrisos complacentes de quem me conhece a escrita e os cantos aos sonhos.

Casa desarrumada de quem teve a sorte de os viver e sentir, ali, agora já de costas viradas contra o tempo.



-Ay, qué hambre tengo yo!


-nos vamos de tapas


-vale!

6 comentários:

Emma Larbos disse...

Adorei o teu caderninho! (peço desculpa pela impertinência do tu mas -caramba!- já espreitamos para a varanda uma da outra há algum tempo!)
Pois o caderno de sombras e espaços amarelos encantou-me. Espero que seja mesmo teu, porque combina com o ar que imagino que terás ao vivo.
Lembras-me agora uma coisa que, na altura, me deu grande vontade de rir. Lá nas paragens de Cáceres, por onde andei, lembrei-me de ti. Então não é que, entrando eu nuns aseos, onde, por acaso e circunstâncias várias, se concentrava grande quantidade de medievalistas, uma delas desata às tantas a bater com o calcanhar no chão e a voltear os braços por cima da cabeça? Então não é que até em lugares de frequência higiénica as medievalista espanholas lhes dá para ensaiar passos de flamenco? Estive quase para lhe perguntar se não conheceria uma portuguesa, de seu nome Lizzie, e se era frequentadora de bares madrilenos da especialidade. Soube depois que era de Valladolid.

Lizzie disse...

Ai Emma que bem que me sabe o Tu, que sou pessoa de poucas formalidades.
Uma das coisas que eu acho graça em Espanha é a veneta da dança.Já assisti em pleno Carrefour,ao pé daquelas alfaces enclausuradas que eles têm,horríveis,um grupo de raparigas universitárias começarem a dançar e a cantar e às tantas começar um jaleo divertidíssimo.É coisa contagiosa.

O caderninho é mesmo meu e, se eu tivesse vergonha na cara, nem mostrava aqueles simbolos com setas e quadrados aqui. Já que fala em medievalistas é a mesma coisa que mostrar hieróglifos das pirãmides e dizer que é escrita do séc.XII. Aquela srª de óculos e barrete na cabeça que está na segunda fotografia só abana a cabeça.Diz que sou uma desgraçada inventona, veja lá.
Aquele amarelo é um pigmento moído e soluvel em água que se utilizou sempre,até na pintura de frescos.Às vezes misturo outras coisas e divirto-me a ver o resultado.Mestre Bennini,entre outros, deve dar voltas no túmulo.
Hoje estou quase daquela cor por via dum anti-inflamatório e analgésico que me deram no hospital, tal é a dor que se me ferrou na anca.Normalmente sou mais acastanhada, Graças à Srª de Guadalupe.

St. J. disse...

Vale..!

nnannarella disse...

Pois é verdade, porque também eu já assisti a esses ayyy ayyy ayyyy violetera violetera espontâneos, em lugar qualquer, com pezinhos de dança e tacão peremptório, mailas mãozinhas a agarrar o vestido garrido ou até o vinco da calça.

Mas do que mais gostei foi do teu caderninho com setinhas e outras arcanas sinalefas, e de ter percebido o que pode ser um caderninho de ensaiadora. Não é ?

Meu Mártir-Arcanjo, espero que a barregã da dor d'anca tenha sido exterminada e hoje hajas dia pacífico erguido em doces ferros de tenda de sonhos.



Imensos e ternos deles, com fermento e fermento e fermento!

Lizzie disse...

Pues Neno, vale.
Me estan dando ganas de una ensaladilla de calamares y uno llomo de pollo en tomate.

Lizzie disse...

Ai meu Anjo, não é nada caderninho de ensaiadora, isso é mais a sinalefa que está acima.
Isto são a modos que desenhos rápidos com ideias mal enjorcadas.
Discutimos obra e,às vezes eu meto a colherada.Como gosto de mexer nos msteriais aqui vai disto que a quem se destina lá percebe o que eu quero dizer, embora se vá rindo pelo meio. Deixei lá o caderninho inteiro.Dá 100 alembraduras.

E estou pior da borregã da dor porque cheguei a certo sítio e voltei atrás,sempre a conduzir,ai,ai,porque vi que não tinha a carteira. Estava mais ou menos enterrada num vaso. As minhas cadelinhas bebés resolveram esconde-la.Deve ser para eu não gastar dinheiro.São indiscretas e roeram o fecho.Uma das minhas saias estava no vaso ao lado.Deve ser para dar flor.Anda uma pessoa a cria-las para isto...


vasos e vasos