sexta-feira, 21 de setembro de 2007

21 de Setembro


Começa hoje o Outono. Uma estação que não se senta. Anda de um lado para o outro entre a dor e o prazer, entre o nascimento e a morte, entre a luz enternecedora dos dias e a precoce escuridão das noites.

O outono deu-me corpo e veste-me a alma. Embala-a em colcha de feltro da cor pastel que veste a natureza deste lado norte do mundo. Identifica-se com a temperatura recolhida mandada pelo tombar do sol. O silêncio torna-se mais aveludado na germinação daquilo que vou tentando criar baseada no que já fui e que a memória não deixa arrefecer. Foi sempre no Outono que a vida me instalou em trampolim para o que não esperava.





Para outras almas o Outono vem acompanhado duma solidão mais exposta. No recolher dos dias as esperas e os súplicios tornam a dor mais aguda. As luzes na janela do vizinho da frente têm sempre mais companhia. Pensa-se neles com tendo a alma mais amparada. Às vezes é mentira. Mas é fácil invejar o que se imagina.

No Outono o corpo torna-se mais intimo, mais protegido, mais aberto à ternura com amplas doses até de inocência. Tem mais aconchego nas palavras sussurradas debaixo de cobertores cúmplices. As mãos ficam mais sedentas de afagos sem haver justificação necessária para um amor sabido. Cobrem-se os ombros de mantas aos primeiros sinais de frio.

Para outros corpos é tempo de gritar ausências, pele exposta ao vazio e à solidão. É uma urgência indefinida que os massacra, uma saudade engolida, uma fome que tortura. Tanto gritam que atingem patamares em que já não ouvem o próprio grito. Vão para a cama com a pressa que se faça dia. O dia que há-de pôr todas as máscaras.Que escondem corpos não complementados.



Quanto a mim, sinto, confesso, nostalgia na memória dos olhos. Nostalgia de parques imensos carregados de cores quentes. Os avermelhados e ocres das folhas caídas e do imenso som do pisar nelas. As luzes, aos milhares, em arranha-céus, reflectida nos lagos. Dos casacões quase uterinos. De chegar à janela e a ver sublinhada com os primeiros flocos de neve. Nem sequer me apetece lembrar dos lados feios, porcos e maus.Só dos bons, aqueles que inflamam e enchem de mil tonalidades a forma do coração.



E é assim que mais um outono começa. Fruto maduro e vadio que vai andando pelo tempo. O que dele ficar será breve, Passará. Como passaram outros outonos escondidos entre lágrimas e risos, entre amores e desamores, dores e prazeres, repousos e cansaços. Até que um último suspiro lhe leve a vida para o mar.


20 comentários:

Anónimo disse...

Y son las 12 en Portugal.

FELIZ CUMPLEAÑOS, CARIÑO MÍO Y NUESTRO.


"Que tú eres eres tú, la humana primavera
la tierra, el aire, el agua, el fuego
todo"
( Juan Ramón Jimenez )

Por aquí se jalea, con Juan, en tu honor.

Y más:

" Fill your heart
in love today
d`ont play the game of time "

Paul Williams

( esta es de Mar.... )


Lo doblo lo de siempre...
Besos, besos, besos

Emma Larbos disse...

Adorei as petittes heures do Duque do Berry! Bela lembrança, Lizzie!
Ia jurar que ainda era cedo para o Outono mas parece que me enganei e está mesmo a começar.
E já estou a ficar nostálgica! Apetece-me ir para o jardim pisar folhas de plátano e beber chocolate quente nas esplanadas. E trocar casacos pretos uterinos na escudirão das ruas decadentes...

Emma Larbos disse...

Caríssima Lizzie, acabo de ler a mensagem da C. e de perceber o dia que hoje se festeja.
PARABÉNS!!! Um ano a mais não faz mal a ninguém e parece-me que a Lizzie tem dado os seus por bem empregues. Se aqui a tivesse à mão, enviar-lhe-ia uma cegonha com uma concha no bico, de presente. Mas parece que o Outono já as fez regressar a Marrocos...

Anónimo disse...

Aqui a classe trabalhadora manda-te os parabéns. Vai ver o mail.

Como sempre olhas para ti e para os outros...texto arrepiante!

Continua bonita e fresca como sempre foste.

Por muitos e muitos anos.

Aleluia! (Lembras-te?)



Um grande abraço meu e nosso.


João

Lizzie disse...

Jaleando sin mi?

Lo hija....que son vosotras más el gran ....!

Puñetera indiscricíon la tuya.Vaya.

Vos quiero, vos echo de menos. La distancia es una moléstia!

Besos y besos.
Gracias por vuestro regalo. Me ha gustado mucho.

Vuestra Élis de corazon

nnannarella disse...

Querida e Auspiciosa Equinócia Arcânjica, são horas do "até amanhã" por aí, e já não me lerás neste dia, mas aqui fica a minha pegada, leve por cansaço, mas úbere de afecto.

Lizzie disse...

Carissima Emma:

Antes de mais saiba que recebi a sua concha. Mesmo quando partem para Marrocos nunca se esquecem de passar em faróis. Fazem-lhes parte da família. Muito obrigada.

Quanto ao Duc de Berry já é paixão antiga. Como são paixões iluminuras de outros.Tenho gravada e em livros uma colecção que volta e meia admiro.Tudo quanto seja arte medieval.Faço um ligeiro intervalo na renascença e entro outra vez de cabeça no barroco, sobretudo espanhol e flamengo. Regalo para a vista.

Quanto a chocolates quentes, a minha amiga não me diga nada que eu estou de dieta. E de casacos já tenho saudades. O que vale é que o chá que bebo aos litros não engorda. E também é outonal.Quente.Para suavizar os pensamentos.

Um abraço

Lizzie disse...

João, do que vocês se foram lembrar...morta de riso.

Vou a correr à Corporacion Dermoestetica para ver se me restauram o exterior e o interior. Ai filho, estes pés-de-galinha dão-me cabo do ego apesar de fazer só 25.Imagina quando chegar aos 40. E perto dos 50 vou andar de burka,salvo seja.Embuçada.E pára de dizer às pessoas que só tens mais um ano que eu. Ando a fazer operações plásticas para quê,hum?

Um abraço para ti e para eles.
Obrigada.

Lizzie disse...

Ai leio,leio! Atrasadíssima mas ainda arranjo tempo para responder a piscinianos, ofegantes,exaustos,adjectivados e leves Anjos.
Vou guardar a tua pegada na minha alcova de afectos.


Já guardei.Embrulhada em pétalas.

Obrigada

A. disse...

... até que se me morra o Outono sempre de Amor.







... muitos parabêns,
querida Eli.

hora tardia disse...

e começar assim é entrar pela porta maior!



________________

bom outono.


abraço.

nnannarella disse...

Cheira tanto a ele. Fio comum. Trampolim de mudanças.
Não me arranquem deste Outono.

As janelas dos vizinhos, ao longe, fazem um rumor de pecados. As luzes disfarçam luas coléricas e eu não sei o que pensar deles. Dos vizinhos.

Desço a veneziana.

Concentro-me nesta prosa. Ainda é domingo e há tempo. E parece que o tempo tem múltiplos braços, como a buganvília.

Assino o nome, mas é sonambulamente que te continuo a ouvir falar dos parques.

nnannarella disse...

bom dia,
poeta e parto de outono.



gingko e ginkgo deles :)

Lizzie disse...

Meu querido Passarinho:

Espero que o Outono não te morra de amor mas com amor. E que esses teus olhos grandes e de pousar triste acordem todos os dias com o suave brilho da luz que agora se inicia.Sempre.Com pliés ou de pliés já passados.

Muito obrigada e beijinhos.

Lizzie disse...

Hora tardia e vindimada:

Obrigada por ter entrado na porta, e a ter achado grande, que é o outono estação demasiado portentosa para usar a porta de serviço.Deixemos,por isso, que o vento desarrume as árvores,que o vinho crie rios de loucura, que as almas corram no seu próprio espaço à luz dos hinos que inventamos.

Bom outono também para si, obrigada e um abraço.

Lizzie disse...

Oh Nnanna, esqueci-me de te dizer que hoje quando me levantei olhei para uma escada e uma frase me surgiu dos consfins da memória e ainda não saiu:

"Maria não me mates que sou tua mãe".

Vê lá tu o que faz o Outono!

hora tardia disse...

pois...


atrasados mas verdadeiramente da cor mas bela que achar por bem colocAR NO SEU OUTONO, aqui deixo um para/bem de PARABENS...
:))))))))))


____________________
.

Lizzie disse...

Vou pintá-lo de ouro e azul de "Duc de Berry".Azul de principio e fim,aurora e crepúsculo.E vou tentar adormecer acordada.

Obrigada!Volte sempre.

A. disse...

... e tão cansada de dobrar
estes joelhos, Eli.



verdade, nunca gostei... saltei sempre[quase]sem plié, e mal poiso os calcanhares no chão...mas enfim.





sabes... agora vamos. muitas e tantas horas enfiados em longas viagens. vamos pra muito longe, Eli... vamos Todos com o Pedro, a Inês e o Lago, os Cisnes... o Balkan, o Wallencamp e a Olga...




todos juntos... e fé em Buda.
:/

__________________________________



...muito obrigada Eli, talvez volte na doce esperança de
uma tão querida LUZ.

grande abraço.forte.

A. disse...
Este comentário foi removido pelo autor.