segunda-feira, 19 de novembro de 2007

"I want to be alone"




disse ela, a Garbo, no Grand Hotel e nunca mais o sentido daquelas palavras lhe abandonou a pele.

Um dia estavam todos os bailarinos sentados no chão. À espera. E eles chegaram com folhas de papel. Bueno...ia-se contar a vida de três divas do cinema. Três mulheres célebres encomendadas à solidão mais funda : Greta Garbo, Marilyn Monroe e Marlene Dietrich.

Depois apontaram como quem dispara tú lo de Marlene, tú lo de Monroe y tú lo de Garbo.
Alvoroçaram-se as ditas apontadas. Yo?

Eu?
Sim tu!

A memória ainda ouve o pãnico. O mesmo olhar vago e triste? A mesma maneira de andar, pouca correcta postura? A mesma maneira de usar as mãos? Ay qué coño.
Foge o sono, foge o apetite. Sonha-se com 1m e 75 de altura, sonha-se com o talento que nunca se sentiu, corre-se para a investigação. Sabe-se que nasceu num dia 18 de Setembro, olha tão perto do Outono, sabe-se que foi auxiliar de barbeiro, depois modelo de chapéus, depois estudou teatro, depois passou de Greta Lovisa Gustafsson (sei lá se está bem escrito) e depois sintetizou para Garbo, ainda não se sabe porquê porque ela nunca disse, mas talvez seja o nome das ninfas nórdicas que dançam em noites de luar. E que foi para Hollywood, sem vontade, sempre agarrada a homens protectores a subtituirem o pai defunto. E que gozavam com ela por causa da voz e da maldita pronúncia, e que fez dietas porque era roliça, e arranjou um dente torto, e puxava o cabelo para trás ou usava chapéu para alongar o rosto, e que teve amantes, mais mulheres que homens e que foi subtituída por mais bonitas e novas e que sempre teve vontade de interpretar uma mulher palhaço, porque gostava de metáforas e pinturas e solidão. Tanta solidão.

E todos os filmes se viram sem ligar o som. Só a fluência dos gestos. Só o arrebatar das expressões, das pequenas expressões, aquelas que se intuem mais do que se veêm. As que esmagam ainda mais os parcos 1m e 60.

E um dia chamou-a, à ínfima, Concha. Sientaté. E sentou-se. Concha ia fazendo o desenho como quem faz desenho à vista. Los puñeteros de tus ojos, chica. Era preciso torná-los menos redondos e mais pequenos, e a boca, e






assim sem mais nem porquê, Concha, Concha, Concha !

E depois é melhor já não pensar, é melhor que tudo parta de dentro, aos gritos de uma forma serena, que a verdadeira tinha fobia de discussões ou violências. Trabalha-se até altas horas, para que o arrastar das mágoas se solte num chão duro, o vestido que fale que esta voz dorida do corpo é impotente.




Lá para o fim há-de tombar a Marilyn, há-de ir ela levantá-la do chão, já meia morta, e dar-lhe um beijo de empatia e alento na boca enquanto a Marlene se ri. Ria-se sempre dos gestos íntimos de quem sofre, ela que sempre fingiu não sofrer.
E chegou o dia. Burburinho difuso do outro lado. As pernas tremem. Seca-se a boca. Á la mierda, chicas del..... berra Concha ainda de apretechos maquilhadores na mão.
E a Garbo sobe primeiro, é a mais velha, embora despida seja a mais nova. Coloca-se à boca de cena. Sobe o pano. E vive rodeada dos fantasmas que nunca esqueceu. De chapéu e casacão. Quase incógnita, como viria a morrer, em 1990, num hospital de New York City,ou seja, como quem continua bem vivo ainda para lá da eternidade.





12 comentários:

nnannarella disse...

Fabulosa Lizzie Garbo. Só que a tua boca é mais coração...:)

E assim retorna um outro Novembro, em que entras, enigmática e generosa, de Greta e de Garbo num lugar chamado costelas de adão, onde depois trazes a Blimunda e os teus olhos violeta de Ava Gadner. Ninguém podia fazer ideia que eram as muletas, a Greta e a Garbo.
Passou-se um ano e agora ficámos a saber a história toda. Com ilustrações reais e tudo...:)

divas e divas deles!

Emma Larbos disse...

Magnífica forma de festejar o primeiro aniversário!
Primeiro deixa-me suspender um bocadinho o fôlego em suspiro de nostalgia das Costelas...
Depois, abraço-te pela estreia da Greta. Na altura eu não estava lá por isso entrego-te agora um ramo de gladíolos brancos directamente no camarim.

PS - queremos uma foto actual da Blimunda!

Lizzie disse...

Meu Anjo e Mi Emma, é só uma pequena ilustração,a pior, para as outras teria que pedir autorização e o Japão fica ainda longe.

A história toda é basto comprida, meteu até quase facadas,pois que tubarões mordem em todos os mares, gestos inesquecíveis de amizades ou amores e tanta coisa que, resumindo, valeu a pena, sim senhoras.

Quanto a maquilhagens, queria a malvada e palavrónica sevilhana da dita Concha que eu depilasse sobrancelhas e parte baixa da testa mais têmporas e queria-me parecer que ficaria parecida com Queen Elizabeth the first e fiz birra a que ninguém estava habituado.

Muito te agradeço as flores, Mi Emma, que não me lembro nunca de ter tido tal nervoseira. Senti-me esposta tanto mais que ficava para aí um eterno minuto sem fazer nada a não ser olhar em diversas direcções. Só fiquei mais calma quando ouvi a frase, em off, voz autêntica, a dizer I want to be alone. Mais uns segundos, para nós chamam-se tempos, e começava a acção.Aí o mundo deixa de existir, ou quase.
Não tenho nenhuma foto actual da Blimunda, mas sei que é uma mariquinhas pé de salsa com pavor de trovoadas e de mais coisas que a natureza oferece.Mas ratinhos...

Ainda não comi. Estou com fome.

Anónimo disse...

Ouvi dizer que foi um espanto!

Disse-me uma colega da C.C.!

Escolhas certas!

Viu o profissionalismo da " tragédia "!

Uma lição para todas nós!

Quem é grande a subir sem querer é grande sempre!

É o que interessa!


Um grande abraço!
Comovido!



P.

Lizzie disse...

É assim a vida, P.,nós fomos buscar lição a outras antes de nós; vocês, se nos foram buscar a nós, ficamos muito contentes.
Mas isso de lições é mais com a C.C..

A propósito de tragédia, hoje dói que se farta.

E não me custa nada imaginar-te de Garbo, embora para ti escolhece a Callas. Nunca pensaram nisso?

Pois...

Obrigada
beijinhos

Anónimo disse...

...muito obrigada por tanto, Eli.







i wish i cold kiss you.

_____________________________...

Emma Larbos disse...

Não deixa de ser interessante que na Garbo a construção do mito se tenha feito sobretudo devido às suas características mais nórdicas: a distância, a contenção a frieza é que a fizeram misteriosa. Enfim, e se calhar o ar andrógino, que não permitia encaixá-la em padrões habitualmente femininos. A retirada no auge fez o resto.

Haddock disse...

...
muito indecente... só nós é que não sabemos da história a metade!! e nem nos convidaram para a festa de aniversário...

seja como for, ainda que amuados, rendemo-nos à descrição (...magnífica, não, só porque parece copiado, mas...) admirável que fizésteis, lizzie, de uma das poucas divas nórdicas que merecem ser celebradas!!
desconhecíamos a homenagem e ainda estamos a tentar descortinar onde foi e promovida por quem.
e numa coisa a senhora De larbos tem razão (...) "a retirada no auge fez o resto".

vénia...

Lizzie disse...

Oh minha querida Ana, não sei se é tanto, mas é só o possível.
Hoje, o que eu gosto de ver é os outros continuarem a dar tanto. É quase um prolongamento. Às vezes identifico-me. Tenho a memória, é quase um instinto, no corpo. Por isso é que dou tanta importãncia a pormenores de alças caídas, empatias e coisas do género.


Um grande beijo para ti.

Lizzie disse...

Mi Emma, não sei se era frieza,timidez, ou desadaptação. Li cartas dela, injustamente tornadas públicas, em que fala do mundo de Hollywood como sendo um circo em que se devoravam os sentimentos e os valores.
Até o Onassis, grande caçador, lhe quis deitar a mão. Depois virou-se para a Callas que na altura era mais mediática.
As opiniões que li acerca dela apontam todos para uma figura calada, isolada, com muitas ideias pouco comerciais para a época.
A retirada deu-se no meio de guerras entre agentes e mais coisas pouco dignas.
Ela nunca teve as garras tão aguçadas nem o engenho da Marlene.
Parece que fugia ao mais pequeno atrito até que fugiu de vez.



Amuado Capitão, pois que muito nos espanta vosso estado, pois que só agora sois chegado e tal Gretice já dura, quase em episódios, vai para um ano. Já lá estáveis? Quando coxinha fui às saudosas Costelas aparecida?
Não me tenteis a pôr cópias mais fiéis que se me bota o espírito confuso ao olhá-las.

Se vos referirdes ao espectáculo, sabei que os animais ainda botavam humana faladura, tantos já são os anos passados, e descansai que octogenária não sou.
Foi numa defunta companhia dada a experiências em Madrid, assim muito contemporânea. Depois deste só durou mais seis meses.
Cada pessoa foi para seu lado.
Duras foram as penas, que já nessa altura havia a moda de pôr a mandar quem nada percebia dos assuntos.
Enfim, carreiras...

E perante vós me curvo,
assim

A. disse...
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A. disse...
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