quinta-feira, 3 de abril de 2008

The nude and the naked




assim em inglês, já que têm vasta literatura sobre o assunto e são rigorosos na distinção.

O naked, vou traduzir simplesmente por despido, corresponde à situação de estar sem roupa no comum dos dias, implicando na nossa cultura ocidental, e em situações fora do contexto próprio, grande vergonha e embaraço que ninguém se sente bem como veio ao mundo na via pública de pudendas partes ao léu. Acho eu.

O nude, aplicam-no eles para formas artísticas. Durante muito tempo o corpo foi uma forma, quase abstracta, de exprimir formas de beleza de acordo com os padrões e exigências de cada época, ou seja representava um ideal distante dos corpos reais. Olhem a colecção de Vénus, algumas sujeitas a regras matemáticas de proporções entre as anatómicas partes.








Continuando a praticar a arte do muito resumido, mais digo que tem havido discussão onde começam e acabam o naked e o nude, que é coisa que tendo em conta as imagens da publicidade ligadas quase sempre ao desejo ou à forma de o provocar








da propaganda e opiniões políticas como este corpo "nazi "







ou estes corpos saídos da contestação face à ditadura que na moda, a partir dos anos sessenta e com a Twiggy, impuseram o corpo andrógino, infantil , magro e, por vezes, artificial.







Na dança a evolução andou em curvas e contra curvas.




Na corte de Her Magesty Elizabeth I, grande amante da dança, eram desenhados fatos rebuscadíssimos para a função. Jones era exímio na complicação da dançarina vestimenta.



Na época romântica, os fatos eram, entre tutus e maillots, quase standard .



Diaghilev começou a contratar especialistas para fazer figurinos mas o pai e grande advogado da relação coreografia-bailarino-cenário-roupa, dando liberdade criativa aos desenhadores, foi Fokine. Muitos foram os artistas plásticos convidados a desenhar figurinos. Cada uma das partes potenciava as outras mantendo a coreografia como centro. Se me permitem, também é essa a minha opinião.


Não me esqueço dos efeitos visuais de Martha Graham






do dramatismo da simples combinação branca de Pina Bausch






ou do quase desespero feito roupa do vestido molhado e do movimento das mangas no Pedro e Inês de Olga Roriz.









Mas quem começou com a nudez integral na dança foram os expressionistas alemães e Isadora Duncan. Esta pela liberdade “grega” total dos movimentos, aqueles pela expressão dramática e vazia de artifícios que tem um corpo nu.

A época áurea dos despidos, recuso-me a chamar-lhes nus, foram os alvores da dança pós moderna em que, rejeitando toda a história e técnica, a dança era todo o movimento ou pausa e teatro toda e qualquer conversa. Coreografias houve de pessoas a andar, só a andar, no palco. Ou só sentadas. Como em outras artes era Dada ressuscitado. Life is art, art is life.

Numa fúria anárquica e em nome da liberdade, alguns desses coreógrafos, exigiam que os bailarinos se esquecessem da sua formação, se despersonalizassem através de expressão amorfa e se despissem. Para alguns o corpo despido deixou de ser nu, veículo de estudo de movimento ou instrumento de narração, para ser mera ferramenta de choque contra a cultura judaico-cristã dominante no ocidente.




Foi assim que vi, em vídeo, espectáculos vazios e inestéticos. Foi assim que ouvi as queixas dos incómodos dos bailarinos, às vezes com equimoses por causa dos arrastamentos pelo chão. O corpo humano não é plano e o chão nem sempre é de veludo.


Na era pós Franco, em Barcelona, já bem entrados os anos noventa, houve mesmo, só e exclusivamente, masturbação e relações sexuais mecânicas, sem sequer um contexto afectivo, positivo ou negativo, em palco. Numa conferência o coreógrafo disse que era dança porque sim. Bastava ele achar que era. Vomitava assim o pudor. O sexo deveria ser coisa de prática pública no palco ou na rua.











E saímos vazios. Sentimos vazio.



Na dança contemporãnea, pois ele há de tudo. Com ou sem meio que justifique o fim.




Afinal, talvez a liberdade suprema seja a possibilidade de escolha do que se quer ver, mesmo quando toca a tragédia, que melhor se enquadre na expressão pedida pela nossa alma.


Amassada na História que nos formou os velhos e nos preparará os futuros pensamentos.




E fim do resumo resumido.

16 comentários:

pentelho real disse...

senhora,
ficarei quase feliz se algum dia -e disso tenho muitas dúvidas- se algum dia conseguir fazer um artigo como o que aqui deixasteis.
este é na verdade um dos blogs de que gosto.
adeus

A. disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Lizzie disse...

Alteza:
muito vos agradeço tal elogio e honra,que não mereço em tamanho, mas não duvideis das vossas capacidades, pois que ainda agora andais no frutuoso mester de aprender junto de V. doutas madres e decerto serão mais entendidas que eu em tais questões, sobretudo no corpo "pathos", que assim são classificados, se bem me lembro, nas artes, os santos e outros nús, supliciados.

Agradecida reverência

Haddock disse...

por uma questão de pudor, hoje escrevemos-vos atrás do biombo...
é que dizem os convencidos que estar despido (ou nú?) é um estado de espírito e nós não conseguimos decidir-nos sobre qual é o nosso! deve ser do despertar primavera...

também nos aborrece essa tal fúria anárquica de que falais, lizzie, com propósitos vaziamente chocativos, totalmente desprovida de substrato... sabemos lá... ideológico, artístico, humorístico, por aí fora...
fizeste-nos lembrar, a despropósito, dirás, os "la fura dels baus", que tiveram dias bons e outros maus...

elogio aos exemplos vestidos; autênticos nús!!

vénia...

Haddock disse...

ahh, por favor, tirai por nós o acento ao nu. ele dispensa-o, tal é a sua simplicidade...

gratíssimos...

margarida já muito desfolhada disse...

lizzie,
e já agora façamos uma manif!!!

Lizzie disse...

Capitão:
Ainda bem que também sois de vos irritar com vazios.
Quando conhecemos alguns destes vazios, já eram entradotes na idade e continuavam com tiques da mais alta burguesia com intenções de ditadura.

E tendes razão em relação aos Fura. Como sabeis, têm espectáculos para Barcelona e outros para o resto. Botámos neste postal uma fotografia deles e tirámos. Não achamos graça a que se sacrifiquem animais, se atem os braços a uma menor com película aderente e depois um familiar dela se sirva, ou que se atirem pedaços de carne podre para cima do público.
Dizem-nos que são metáforas políticas. Mas não será metáfora um dizer que acha lindos os traços estilizados dos fregueses dos campos de concentração. Do trabalho que expõe nem somos capazes de falar. Só fomos capazes de ver a primeira sala. Que culpa têm os cães e os gatos e os pássaros.

Enfim, regalemo-nos com os nus, mesmo quando vestidos

Continência

Lizzie disse...

Pétalas perdidas, já lá vou.

Anónimo disse...

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Emma Larbos disse...

Lizzie,

Há quem diga que a sensatez e o bom gosto são águas mornas resignadas pela falta da inspiração e que a rebeldia é o único gesto criativo.
Este teu post mostra porque é que não. A rebeldia só é criadora se não for gratuita. Se não for porque sim. E a sensatez é aquela centelha de equlíbrio tão difícil de alcançar que mal alguém se descuida e logo lhe escorrega o pé para a fúria ou para o jargão.
A beleza e a arte andam algures por aí, em busca dos mais difíceis equilíbrios, nas razões de ser rebelde.

Lizzie disse...

Pois é, Mi Emma, é tal o afã de arranjar argumentos para defender a insensatez como ingrediente maior da criação que, por vezes até se inventam biografias que distorcem os factos.
Olhando para a história da arte, sobretudo para a da dança, vai-se vendo como as revoluções que marcaram cada época, foram pensadas com estrutura e base histórica. Não porque sim.
Por alguma razão,Twyla Tharp, coreógrafa desta geração pós moderna e nos anos oitenta, directora do American Ballet Theatre, onde misturou o Ballet Clássico com escolas mais contemporâneas, seguia o mote de Shakespeare: pode ser loucura, mas tem que haver método nela.

Já falei e ainda hei-de falar de mais alguns criadores em que o equilíbrio foi mestre em abrir portas seguras ao que antes era fechado. Aqueles a quem, com respeito e admiração, se chama revolucionários. Tanto, que hoje quem lhes seguiu os ensinamentos, continua a abri-las de olhos voltados para a esfera pública e privada. Sem cair. A história encarrega-se sempre da memória.

Emma Larbos disse...

Nos nus dançantes o que mais me choca - ainda mais do que o inestético - é a quebra da barreira entre a expressão e a depradação da intimidade.

A. disse...

...a minha profunda gratidão, mi Eli.e espero que tenhas gostado.

grande e forte abraço.meu.








[...talvez lá esteja Sábado...com Anton Friedrich Wilhelm von Webern...]?

*

Lizzie disse...

Mi Emma, quando não há talento mas há vontade de protagonismo, usam-se todos os meios para que não se lhe note a falta. Claro que há excepções, mas a minha estatística fala-me maioritáriamente em vazios de conteúdo com adornos de conversa teórica, às vezes pseudo poética.
Enfim, acabo sempre por gostar mais do sugerido do que o explicitado. Aquele abre a imaginação, este fecha-a. Acho que quando se vê uma obra de arte e se sonha, ela se completa, prolonga e enriquece. O resto são puras banalidades embrulhadas em papel de luxo.

Lizzie disse...

Passarinho:
Pois gostei. Já vi a Cantata por quatro companhias. Esta está de muitos parabéns. Vê-se bem o quanto a formação clássica é importante como base para tudo.

Quanto ao 2º, claro que é subjectivo, claro que tenho todo o respeito pelo trabalho das pessoas. Adorei a maturidade morena do bailarino. É quase comovente tanta força para tanta delicadeza.
Na parte feminina...há uma que gostaria mais.E a seguir outra. Têm assinatura quando dançam. Mesmo que as visse desfocadas através de uma cortina, saberia que eram elas.

E claro que senti a falta. Doeu-me. Como entrar numa casa vazia que foi cheia.

Webern ficará contente se sábado mais alguém lhe sentir as notas.



Apertado, com nó.

A. disse...
Este comentário foi removido pelo autor.