sexta-feira, 17 de junho de 2011

Vai este em segunda e atrasada versão, já que o primeiro foi engolido nas palavras pelo blogger na face de "publicar mensagem" e nele não faço ideia do que escrevi, embora me pareça que foi mais ou menos assim, se não na forma, pelo menos no conteúdo.





Dos voos na correnteza dos ventos trilingues com sopro de Monteverdi, entre outros.





Senhores:


Pronto, foi tão curto o voo que não cheguei a sentir a medida do horizonte!



Talvez seja coisa da idade, esta de ser mais difícil uma pessoa se libertar, quando se ergue, do peso da lama que leva nos pés que conservar a leveza do céu que tráz na cabeça aquando a aterragem.


Talvez para mais que restaurar a pele da alma, sirvam os dias livres para dar paliativo aos sulcos da secura que as obrigações provocam. Há quem, de forma convicta, sisuda e compenetrada lhe chame responsabilidade. Prefiro chamar-lhe o preço da sobrevivência. Pois.

Perdoem-me o pragmatismo mas, com as rugas acumuladas nas euforias, nos sonhos e na História, fica-se com a vista cansada para os sorrisos rasgados do futuro.



Por isso, Senhores, resta, o que já não é pouco, sentir bem sentido e observado o que existe, o que pelo génio abstracto, humano, natural e etc, foi criado e continua em criação. O maior dos alimentos para o espírito bulímico.

Celebre-se então e por exemplo, Senhores, el gazpacho bem fresco e ao final da tarde, com os seus pepinos e orgulhosos tomates, ingredientes bem triturados e sem vergonha das calúnias bactéricas germãnicas que tanta gente levam à desgraça ou não andasse já o mundo tão cansado da manha especulativa.




Qualquer dia, nesta guerra com generais subterrãneos, ainda se descobre que o uso de castanholas provoca a queda irreversível dos dedos.




E soltem-se, sem aviso nem programação, pernas e braços recheados de alma folgazâ ao som de um estudo de Boogie Woogie de Gould, já a ponta da noite toca no início da madrugada e Londres se foi esvaindo nas asas do avião.


Nem interessa que haja quem tenha o braço ao peito nem que eu tenha a mão esquerda ligada.


E se nós pegássemos nisto e...?


Londres onde, numa cerimónia universitária , prendi lágrimas latinas e judaicas, comovidas, nas pestanas inglesas.


Melhor ser só espanhol, como os que na plateia me acompanhavam, com olhos de uma só cor e sem obrigação remota de barragem.


E fui eu que escolhi a música, em segredo e porque sim , porque umas Vésperas de Monteverdi me vieram à cabeça com a velocidade e a força de e para um longo afecto.


O coro, os sopros e a exaltação ligam com quem desfila, com o andar altivo e solene que tem quando fica com nervos. Sobretudo com os nervos.


E de visita encomendada ao Old Uncle James que pelos seus noventa e tal anos nunca conheci muito novo.

Foi-me sempre velho. O da Royal Navy da farda bonita.




Olha para mim e chama-me Margaret, what a surprise, my dear Maggie!




E digo-lhe que sou a E.


E ele sorri e concorda, oh of course you are, Margaret!


Lembro-me de um conhecido meu, neurofisiologista de ofício, me dizer que os velhos ficam a modos com o cérebro encolhido, com sinapses feitas de nada e portanto, eu, a E. também conhecida às vezes, na família por B., imagino-me enfiada numa sala escura lá na sua memória. Discreta, na mais profunda das inexistências, rodeada de interrupções e hiatos que não conheço.




Mas pronto, como é preferível ser anjo emprestado a memória devolvida, claro que me lembro das aventuras no Egipto, daquela viagem aquando a fundação do Estado de Israel...



dos bombardeamentos sobre Londres na 2ª Guerra.
E quando nadámos para o Bugio, em Lisboa...

A minha vida nele não tem sequência cronológica. Nem luz nem sombra. Anda aos saltos como o brilho que vai aparecendo nos olhos baços. Como um interruptor que ligue a felicidade.


Que destemida que eu fui. Que sedutora para as vidas ritualizadas, ordenadas à prova de sobressaltos ou surpresas. Como a paixão. Ou a descoberta.



Só me esqueço da minha morte, lá para meados dos anos sessenta, ao volante de um Mini.

Prometo-lhe que o irei visitar outra vez, talvez para jantar, quando voltar de Paris.

Promise me, please Margaret!


No doubt about it, sweet Jamie...

já te contei a história da princesa, do bobo e do saltimbanco que foram transformados em pedra velha que nunca arrefece, nem quando neva?

Érase una vez una princesa de lo más mamarracho que puedas creerte. Ay, que fea era la pobre niña. Tenia las narices....


E na planação nos dias das horas soltas, das siestas entorpecidas ao som de música descoberta, (Evening Bells, com canto e sinos de anónimo medievo e que bem poderia ter servido de inspiração para Les Trois Cloches de Edith Piaf), na passagem rápida pela Londres que é parte da minha natureza, resistiu o tempo à minha vontade de atraso.



Nem cumpri as tradições madrilenas das manhãs do dia de Stº António, nem comprei o manjerico à chegada a Lisboa.

Senhores, encolhi os ombros e limitei-me a aterrar num chão duro.


O chão que a História, as histórias, desconfiam e resistem a amolecer.


7 comentários:

augusto, um entre mil disse...

Senhora,

como vos admiro assim prenhe de viagens, emoções, memórias e pensamentos.

eu ficarei, lá mais para a frente, por uma pacata estada em termas de s. pedro do sul ouvindo, até cerca da meia noite, em noite mais ou menos morna, o zé da viola debitando o mesmo reportório de todos os anos. e já lá vou há uns quantos

ponto final


acontece-me, por vezes e, não tão poucas como isso, lembrar-me de quem que já perdi e, por um breve segundo, pensar que ainda estão comigo.


será o começo?



e,
falando de interruptores,

eu tenho.

o meu

permite-me ter sentimentos semi-mornos, nem grandes alegrias nem grandes tristezas. bem, funciona melhor com as alegrias. com as tristezas sempre as vai deixando entrar...


TENHO OUVIDO TÃO POUCA MÚSICA. A PORCARIA DO AXN E OUTROS QUE TAL COM AQUELAS SÉRIES SEMPRE IGUAIS !...

Lizzie disse...

Senhor:

com o calor que está e mais o que há-de fazer, bem viajaria para o Alasca, para uma daquelas casas à beira de rio cristalino.

Bem tento ligar o interruptor para tal mas não chega para o desejado teletransporte.

Talvez daqui a uns anos, quando me meterem na banheira me sinta iluminada ao ver saltar nela uma truta ou sinta aquele cheiro único dos abetos.

Espero não começar a gritar quando vir que é um urso ou ursa quem me lava as costas...
com sorte, as gotas calmantes anti agitação saber-me-ão ao whisky do final da tarde. Marca Haldol (penso que se chamam assim).

Mas,Senhor, segundo a dermatologista castelhana com amplo sentido trágico, se não andar na via pública e todos os dias de óculos escuros, chapéu e protector solar, não chegarei a esta fabricação de felicidades.

Senhor, ser tida como Margaret, ainda por cima pessoa bem mais interessante que eu, foi, provavelmente, como levar um copo de água fresca a uma pessoa involuntariamente sentada num deserto. Ou como chuvada numa terra gretada de tão seca.
Por isso, longe de mim dizer-lhe que Paris só por obrigação bem obrigada.

Senhor, também me acontece e não sei se é o começo dos buracos vazios nos miolos ou o fim da constante e sobretudo entusiasmada renovação da vida.
Chega uma altura, penso, em que já se vai tendo muito passado e na contabilidade haverá mais gente perdida que achada.

E ESTOU COMPLETAMENTE SOLIDÁRIA COM AS VOSSAS MAIÚSCULAS.
Sois vós com esse canal e eu com os concursos dos talentos vários.
Tenho fobia.
Só acendo a tv para dvd e um ou outro noticiário breve e sem enxurrada de crime passional ou de património.

De resto, my music( my book, my work and everything else)is my castle!

Nem que seja de auscultadores, assim uma espécie de cruzados do meu sossego.

Os meus pepinos em vinagre e com sementes de mostarda já devem estar prontos. Que bem sabem para condimentar a refeição!



Os meus mais profundos e sempre regenerados respeitos.

augusto, um entre mil disse...

mas,


Senhora,

se a memória não me baralha traiçoeiramente, não vos permitieis perder os episódios da série "dexter".

os meus respeitos.

Lizzie disse...

Senhor:

que boa memória tendes!

Mas também o Dexter vejo em dvd e com avanço. Preparai-vos, se também sois seguidor, que grandes tramas vão acontecer.

Como são espanhóis, os dvds, às vezes divirto-me a gozar com os castelhanos: nem imaginais como é aquilo dobrado.
Claro que é só para brincar porque prefiro a versão original.


Em dvd também vejo a Weeds porque me distrai tanta gente maluca a falar a sério através da ironia da coisa.

Ao Dr House não acho graça. Conheço gente parecida e fico com vontade de lhe partir a bengala na cabeça. Não exageremos com apetites Dextiscos porque sempre me fez impressão entrar em talhos.

E Senhor, cada vez chego mais tarde a casa...quando chego já o Dexter deitou os sacos pretos ao mar e guardou as lãminas no esconderijo.


Agora ando a ver filmes ingleses dos anos 30 e 40.

Os meus deliquentes respeitos.

bettips disse...

Sempre se leva um afago assim, caloroso, sendo dum velho inglês destemperado e com memórias do deserto! Mas será um canto iluminado de margaridas, Maggie - estou a ver que com tantos Es e Bs, ainda nos chamamos o mesmo!
Da música não tenho tão largo conhecimento, fui aprendendo nos espaços e amando na alegria ou na tristeza; das séries da nossa tvzzz, ainda menos.
Já de contabilidade de afectos sim, sempre a "deve haver" por aí alguém que um dia me entenda.
E já te disse que Londres é um (dos)meu(s) fétiche, uma espécie de bruxedo que me deu, velho, dos anos 70 mas se conserva activo; certo, já disse (ando sempre a dizer o mesmo), não queria deixar o mundo este sem lá voltar, a vaguear.
Reconhecer, que a modernidade ali não assombra/ensombra nem os tijolos, nem as verduras, nem os "mews".
Por ora, reparo que andei, verdadeiramente na acepção da palavra, pelos cabos: desta vez (aquele era o da Roca, com o Raso ao longe) segui marcas de patas e um coelho rápido (Alice no País...) e fui passear ao Cabo Espichel. E os "cabos dos trabalhos" são na verdade, um (re)começo das ideias. Nada como andar à solta.
Soltemo-nos, pois, no devir
... qu'inda o dia é uma criança.
Bjinho

Lizzie disse...

Bettips com B aqui diferente do meu:

se o teu nome fõr tão complicado como o meu, ai o que tens que soletrar: é com Z, com TH. E quando entram os Ws de um dos apelidos? E se o outro é com I ou com E?

(Acresce que na certidão de nascimento estão escritos de uma maneira e no BI de outra por via de actualizações ortográficas e já me disseram que com o acordo ortográfico volta tudo ao nascimento, ou seja, anda para aqui uma pessoa ao sabor de uma lingua volúvel e pouco orgulhosa de si. Mas enfim, factos serão sempre facTos.)

Londres corre-me do sangue para a pele, Madrid entranhou-se-me até me colorir a alma, Boston foi uma espécie de transplante londrino compatível e de Lisboa farei o balanço justo quando morrer.
De outras, tenho ideia de serem casacos confortáveis, corpos medrosos mas arejados. Enfim, outras são lã tão quente que arranha ou abafa.

Talvez só em Londres e Boston se possa ter a ideia mais arrojada possível, a arte mais desafiadora enquanto se bebe um secular chá nos moldes mais convencionais. Sabe-se-lá se a pie ou os scones terão sido feitos no momento ou há séculos:))

Sabe-se-lá se o Old Uncle James não teve um ataque de voiced tears, já que raramente um velho inglês ou inglesa exibem os rios que guardam nos olhos.

Como em toda a gente de todos os países, davam para regar as flores dos jardins que avivam o tijolo das casas.

Ali, como sabes, escondem-se, os rios, no verde.

Quem me acompanhou, disse-me que está o Oldie James perdoado: parece que sou a modos que parecida com a tal Maggie, segundo dela relatam as fotografias.

Mas enfim, tanto os espelhos como as fotografias, raramente emitem opiniões isentas, fidedignas e seguras. Convenhamos que são trapalhões.

Se me der ao trabalho, à empresa de me concentrar numa só coisa e não andar a vaguear em busca de tantos inícios, de tantas músicas soltas no tempo e no espaço, talvez daqui a uns quatro anos, ou menos ou mais, alguém tenha que escolher uma música para mim, que dê com o meu andar, com o que se vê do outro lado da fotografia, aquele que não se vê e que foi marcado pelos respiros de Londres. Pois foi.

Entretanto, ainda me falta um mês e tal para contar, face à vista de muito mar não domesticado, alguma ou outra lenda em que as gaivotas roubam corações para os espalhar pelos rios verdes do mundo. Com ou sem risos ou barragens.

Bjs

Alien8 disse...

Ora, Margaret, what's in a name?, já perguntava o outro.

Por mim podes muito bem ser L. Ou E.

As histórias são (as) tuas, as viagens também. E, ousaria dizê-lo, o gazpacho!

E assim embalado nas voltas do teu escrever e ilustrar, te desejo um excelente tempo de reflexão, quero dizer, descanso, férias, viagens, boquerones ou o equivalente noutras paragens, e o mais que te apeteça.

Um abraço, de ambos!